O dia está bonito, pus um vestido bonito e acho que me ias gostar de ver com ele.
O que eu não dava para te ver hoje, barbeado e arranjado, a cheirar a perfume ao invés do cheirinho a sovaco e a tabaco do costume.
Mas ao domingo nunca me queres ver.
Falas em descanso, que precisas de dormir e que temos muito tempo para andar aos beijinhos.
Se fosse daquelas que se arranja para o dito cujo, andava sempre desgrenhada.
Depois pico-te, tiro foto e publico como quem não quer a coisa, como se eu não quisesse que vejas e aplaudas e arranjes desculpa para me tirar o dito vestido de cima e acabes ou por cima ou por baixo.
Mas ao domingo nunca dá.
Mas há sempre quem me veja, e te vá dizer que me viram muito arranjada e para teres cuidado.
É domingo,só queres paz e sossego.
Segunda-feira tratas do assunto, segunda-feira já é dia de me querer.
Se há coisa da qual não me posso queixar é de ter um trabalho entediante.
Bem pelo contrário.
Às vezes até preferia que fosse mais calmo, mas quando penso ter acertado na fórmula e estar aos saltinhos porque desta é que é ,e agora é que vão ver o que é trabalhar e...vai tudo por água abaixo.
Se não fosse tão teimosa já tinha mudado de vida.
Ou se não gostasse tanto da terra, da sensação única de ver crescer, colher o fruto de uma campanha inteira, de uma jornada que começa na poda e acaba em festa nas vindimas.
E a paisagem. O cheiro da terra molhada, o assobiar do vento nos ferros da vinha, as cores da vinha nas diferentes estações do ano, nos diferentes estados fenológicos.
O sentido de responsabilidade.
Ter a capacidade de ensinar e aprender, saber lidar com diferentes personalidades, ser tenaz e sagaz, mas sobretudo, teimosia.
A vida na vinha é feita sobretudo de teimosia e muita da história do vinho se deve a grandes apaixonados que também são teimosos.
Sem acreditar não se chega a lado algum.
E independentemente de como as coisas corram, apraz dizer que sou tremendamente apaixonada por aquilo que, mais do que o meu ofício, é a minha paixão.